quinta-feira, 12 de agosto de 2010

O Grifo


"Monstros alados" é como Heródoto chama aos Grifos ao referir a sua guerra contínua com os Arimaspos; quase tão impreciso é Plínio que fala das orelhas compridas e do bico curvo destes "pássaros fabulosos" (X, 70). Talvez a descrição mais pormenorizada seja a do problemático Sir John Mandeville, no capítulo oitenta e cinco das suas famosas Viagens.
"Desta terra (Turquia) os homens partirão para a terra de Bactriana, onde há homens malvados e astutos, e nessa terra há árvores que dão lã, como se fossem ovelhas, de que fazem tecidos. Nessa terra há ypotains (hipopótamos) que por vezes vivem na terra, por vezes na água, e são metade homem e metade cavalo, e só se alimentam de homens quando os apanham. Nessa terra há muitos Grifos, mais do que noutros lugares, e alguns dizem que têm o corpo dianteiro de águia e o traseiro de leão, e isso é verdade, porque assim são feitos, mas o Grifo tem o corpo maior que oito leões e é mais robusto que cem águias. Porque sem dúvida levará em voo para o seu ninho um cavalo com o ginete ou dois bois juntos quando andam a lavrar, porque têm grandes unhas nos pés, do tamanho do corpo dos bois e com elas fazem copos para beber e com as costelas arcos para atirar."
Em Madagáscar, outro famoso viajante, Marco Polo, ouviu falar do roque e a princípio entendeu que se referiam ao ucello grifone, ao pássaro Grifo (Viagens, III, 36).
Na Idade Média, a simbologia do Grifo é contraditória. Um bestiário italiano diz que significa o demónio; em geral, é emblema de Cristo e assim o explica Isidoro de Sevilha nas suas Etymiologiae. "Cristo é leão porque reina e tem a força; é águia porque, depois da ressurreição, sobe ao céu."

No canto vinte e nove d' O Purgatório, Dante sonha com um carro triunfal puxado por um Grifo; a parte de águia é dourada, a de leão é branca, misturada com vermelho, por querer significar, segundo os comentadores, a natureza humana de Cristo. (Branco misturado com vermelho dá a cor da carne)

Outros comentadores entendem que Dante queria simbolizar o Papa, que é sacerdote e rei. Escreve Didron, na sua Iconografia Cristã: "O Papa, como pontífice ou águia, eleva-se até ao trono de Deus para receber as suas ordens, e como leão ou rei anda pela terra com força e com vigor."

Jorge Luís Borges, O Livro dos Seres Imaginários
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