terça-feira, 23 de agosto de 2011

A bruxa e os dois ladrões


Dois ladrões lembraram-se, certa noite, de assaltar a casa de uma mulher que vivia sozinha e que, ao que lhes constava, era pessoa de grandes teres.
Julgando-a a dormir, os ladrões subiram sorrateiramente a um janelo e entraram na casa, onde vasculharam tudo o que puderam à procura de coisa que valesse a pena roubar. A dada altura, porque o barulho que faziam já era muito e a dona da casa não dava qualquer sinal, os ladrões aperceberam-se de que, afinal, não se encontrava lá mais ninguém. Podiam, por isso, roubar à vontade.
- Onde teria ela ido a estas horas? — perguntaram um para o outro.
Nisto, um deles, ao remexer por baixo do escano, junto à chaminé, encontrou uma estranha taça, com um líquido meio amarelado, que tanto podia ser azeite como podia ser mel, ou coisa parecida. E logo desconfiaram que a mulher era uma bruxa, e que, àquela hora, teria ido embogar-se a qualquer lado. A explicação estava naquela taça que tinha o óleo com que ela se untava antes de partir.
Mas a curiosidade tentou-os. Os dois ladrões resolveram untar-se também para verem o efeito, e, mal acabaram de o fazer, voaram ambos pela chaminé, indo pousar ao cimo da torre da igreja, de onde não puderam descer. Na manhã seguinte, quando as pessoas saíam de casa para o trabalho, deram pela presença dos dois homens empoleirados no campanário e todas desataram em grandes gargalhadas.
- Tirem-nos daqui! Tirem-nos daqui! — gritavam eles.
- E como diabo é que vós fostes aí parar? — perguntavam as pessoas, ao mesmo tempo que procuravam uma escada comprida para os tirarem dali.
Eles, no entanto, não deram qualquer explicação. Se o fizessem teriam de confessar que haviam estado a roubar uma casa na aldeia. E, assim, nem eles acusaram a mulher como bruxa, nem esta os acusou a eles como ladrões.

Local: Vinhais, Bragança
PARAFITA, Alexandre, O Maravilhoso Popular - Lendas, contos, mitos, Lisboa, Plátano Editora, 2000

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

As Figuras de Cera

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

As Arcas de Montemor

Conta a lenda que no castelo de Montemor-o-Novo estão enterradas duas arcas: uma cheia de ouro, a outra cheia de peste. Há muito, muito tempo atrás, no tempo dos Mouros, era alcaide de Montemor um viúvo austero, habituado à dura vida fronteiriça, onde eram mais frequentes os tempos de luta do que os momentos de repouso e prazer. Este homem tinha uma única filha que estranhamente amava, pois preferia mantê-la oculta de toda a gente, a ponto de nem aias nem amigas ter consigo.

A menina foi crescendo e o pai não se dava conta - ou talvez, quem sabe, preferisse não saber. Certo dia, um dos seus mail leais cavaleiros olhou-a tão moça e tão linda que se apaixonou. Mas como visse que o alcaide continuava a guardá-la menina, o jovem foi e disse-lhe:
- Senhor, vossa filha é já mulher! Breve virá alguém a levá-la!
- O quê?! Estás louco? Como podeis dizer tal coisa de uma criança?
- Olhai bem, senhor, olhai e vede onde esteve a criança...
- Cala-te!! Ninguém a levará daqui, jamais! Não tornes a dizer-me tais coisas, a menos que queiras ver a tua cabeça rolar das muralhas do castelo!
- Mas, senhor... - insistiu o cavaleiro com mil argumentos vivos.
Insistiu tanto, tanto, que o alcaide se enfureceu e o trancou nas masmorras: no dia seguinte, veria a sua própria cabeça rolar muralhas abaixo.


Foi privada, esta conversa, mas, como por vezes as paredes dos castelos têm ouvidos, toda a gente veio a saber o que se passara. Também a filha do alcaide teve conhecimento da brava discussão, que, sem querer nem saber, motivara e, condoída, decidiu interceder junto do pai. Este, porém, não se dignou a ouvi-la, nem resposta lhe deu, deixando-a especada e espantada porque nunca assim o vira.

Foi só então que se decidiu a descer às masmorras. Falaria com o condenado sem que ninguém o soubesse, nem mesmo o pai. Lá onde o sol nunca fazia visitas, o cavaleiro esperava condenado e sem medo o dia seguinte, passando a sua última noite que era a véspera da grande noite sem retorno. Pensava nas sem-razões daquela conversa com o alcaide. Afinal, a moça nunca olhara para si, nem mesmo adivinhara o grande amor que há tanto o abrasava. E contudo sorria, sorria sem pena e sem medo, dentro da noite.

Tão longe de tudo estava que quando ouviu rodar a chave na fechadura da cela se levantou para acompanhar sem receio o algoz que esperava. Atónito, porém, vislumbrara no contraluz um vulto inesperado de mulher: era ela, aquela filha do alcaide, a dos olhos abrasados de mulher.

Por segundos nem um nem outro souberam o que dizer-se. Ela acabou por dizer-lhe coitado! Ele acabou por responder-lhe desta grã coita de amor! Porque naquela hora tudo lhes era permitido e inconsequente, por ser a noite da véspera da grande noite silenciosa. Ouviram-se ambos e descobriram-se silenciados há muito. Ganhou o cavaleiro aquela batalha que já desistira de lutar, e a moça, essa, leu no seu livro próprio o que nunca soubera encontrar.

E fugiram. Fugiram com tantos cuidados que só na hora dos algozes o vieram a saber. E então foi o pânico geral: como dizer-lhe a ele, a esse alcaide irredutível, as ousadias dos amantes?! Só mesmo o carrasco que sabia cortar cabeças teve a coragem de ir-se a ele e contar-lhe.

Empalideceu o alcaide e esvaziaram-se-lhe os olhos de espanto. Pouco a pouco a fúria começou a subir-lhe o rosto, apoderou-se primeiro dos lábios, que tremeram, incharam depois as narinas, nublaram-se os olhos de ódio, chorou silencioso e agora eternamente só o seu cérebro enlouquecido. Por fim, quando tudo aquilo lhe chegou à voz, bradou:
- Vivos, quero-os vivos! Vou divertir-me finalmente! Ah, ah, ah! Vamos todos aprender a brincar! Ah, ah! Vai depressa, carrasco, vai depressa e traz-me vivos esses meninos que querem brincar comigo!

Partiu o carrasco levando consigo gargalhadas insanas rodopiando-lhe aos ouvidos. Ia com medo e com pena, e com inveja também: era bom fugir como aqueles dois que haviam fugido das suas masmorras e algemas pesadas. Mas ele, ele, como poderia fugir à sua masmorra de adaga, às suas algemas construídas de mil cabeças odiadas pelo seu senhor?! Ah, que inveja lhes tinha, a eles que se queriam inocentes até acharem culpas só de si mesmos!


Achou-os porque era fácil achá-los. Trouxe-os pela mão à presença do senhor de Montemor, que entretanto gastara todo o ódio, todo o medo amealhara no convencimento da solidão irremissível. Por isso, talvez, o terem-lhe encontrado uns olhos vazios e mortos.
- Aqui estão eles, senhor.
- Não vejo! Onde?! Sombras, sombras horríveis... Não os vejo... Só estas sombras, e tenho medo!
- Pai, pai... perdoa-me! Perdoa-me pelo que eu nunca diria! Perdoa-lhe pelo que ele sabia e te disse!
- Senhor, aqui estamos... Casámos... Dá-nos a tua bênção, que queremos viver na paz e contigo!

De repente o velho começou baixo a falar, sozinho:
- Casados?! Nunca! Pensam que eu conheço o perdão, que estou um pouco velho, um pouco louco!
E acrescentou, num tom em crescendo: - Casados? E querem-se felizes? Ah, ah, ah, amaldiçoados, isso sim! Vós e todos os vossos até ao fim dos tempos! Mas... aqui tendes a minha prenda, gozai-vos  dela. Olhai bem, olhai e escolhei porque uma destas arcas está cheia de ouro e a outra... de peste! Escolhei, escolhei... ah, ah, ah!

Assustados, fugiram ambos quando o velho louco se chegou bem perto deles com o seu hálito de insânia. Nunca mais ninguém os viu e até hoje ainda ninguém ousou abrir as duas arcas nupciais enterradas no recinto do velho castelo, uma cheia de ouro, outra cheia de peste.


Fernanda Frazão, Lendas de Portugal

sábado, 13 de agosto de 2011

As 13 Luas Cheias do Ano: A Lua Vermelha


No pico das colheitas, a Lua Cheia aparece no firmamento com tons avermelhados, reflectindo a luz do sol de Agosto. Relembra-nos o rito sacrificial do Deus Carvalho em Lughnasadh, quando se entrega às chamas para dar o trono ao Rei Azevinho.


quinta-feira, 4 de agosto de 2011

Do not stand at my grave and weep

Fated not to die, de Grannie Annie

Do not stand at my grave and weep,
I am not there, I do not sleep.
I am in a thousand winds that blow,
I am the softly falling snow.
I am the gentle showers of rain,
I am the fields of ripening grain.
I am in the morning hush,
I am in the graceful rush
Of beautiful birds in circling flight,
I am the starshine of the night.
I am in the flowers that bloom,
I am in a quiet room.
I am in the birds that sing,
I am in each lovely thing.
Do not stand at my grave and cry,
I am not there - I did not die.


Mary Elizabeth Frye

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

A Coruja


VIBRAÇÃO: alma
PALAVRAS-CHAVE: sabedoria, verdade, rumos de vida
PONTO ALTO: observe, espere e seja sábio
PONTO BAIXO: respeite os seus medos

A Coruja é a águia nocturna. Dotada de visão, ela atravessa os véus da escuridão e da ilusão, rumo à sabedoria que se encontra nas profundezas da alma. A Coruja é o pássaro da alma e, conforme a lenda, a sua aparição significa que a morte está próxima. Essa morte tanto pode ser simbólica como real. A Coruja aparece sempre quando a alma precisa de um rumo na vida (ou através do vale da morte). Com ela vem a verdade conhecida por aqueles que vêem a vida como ela é e aceitam o facto de que vida significa morte, assim como morte significa vida nova. 

A Coruja carrega consigo a magia do vôo silencioso e pode ser um lembrete para ouvir em vez de falar e para viver a vida mostrando gratidão pelas dádivas que o silêncio e a observação atenta podem oferecer.
Ela conduz a alma através da noite, através dos medos e traz uma visão mais clara e uma melhor compreensão do propósito da alma. 

EXERCÍCIO DE MAGIA: Visualização da jornada para a sabedoria

Está a entrar num bosque muito antigo, ao escurecer. Caminhe entre os sons e cheiros da floresta, pelas folhas e flores, animais e árvores, até chegar a uma clareira onde há um velho carvalho iluminado pelos últimos raios de sol e pela lua que se ergue no céu. Senta-se sob a árvore e uma coruja pousa num dos galhos acima da sua cabeça. Cumprimentam-se e você faz uma pergunta. A coruja partilha a sua sabedoria. Algo se solta das garras do pássaro e cai no seu colo: olhe e veja o que é. Agradeça e volte para a entrada do bosque, pelo mesmo caminho por onde veio. Reserve algum tempo para integrar a experiência desta jornada antes de voltar às actividades quotidianas.


Sally Morningstar, O Livro Wicca
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